Ele há coisas que todos vimos e há coisas que ninguém vê.
Nada disto é
novo e todos estamos plenamente conscientes do facto.
No entanto,
raramente estamos de acordo – quer em relação ao que vemos, quer em relação
àquilo que não somos capazes de ver.
Isto porque o
nosso cérebro interpreta o que os olhos lhe enviam e fá-lo à luz da cultura, do
conhecimento, da experiência, qui ça
das capacidades de cada um.
No entanto,
essa é a realidade pela qual cada um de nós está disposto a morrer (e, muitas
vezes, a matar) – aquilo que os nossos olhos veem! Quem é que nunca ouviu a
expressão: “Eu vi! Vi com estes olhos que a terra há de comer! E, se eu vi,
está visto e ninguém tem o direito de duvidar. E se tu, por um qualquer acaso,
viste algo de diferente, então viste mal. Estás enganado”.
É ou não, esta,
a atitude generalizada por nós, humanos?
Imagine-se,
agora, o que não será em relação àquilo que ninguém vê! É um desentendimento
tão grande, mas tão grande, que tem estado, ao longo de séculos, na origem de
muitas guerras – ainda que haja quem afirme que essa é a origem da treta porque
tudo se resume a interesses bem visíveis. Permitam-me discordar. Pode até ser,
e creio bem que é, essa a intenção de quem as provoca – sim, há sempre alguém
que provoca as guerras e não é uma mão cheia de gente -, mas aqueles que as
alimentam, às guerras, aqueles que realmente as combatem, que se deixam
convencer da sua justiça e necessidade, fazem-no para defender aquilo que
ninguém vê. Fazem-no em nome da Fé, da Liberdade, da Justiça e de outros
valores não palpáveis e relativos às culturas e crenças de cada um.
Relativamente
ao que se vê, não vale a pena discutir porque já se percebeu o quão difícil é
levar as pessoas a compreender que as interpretações daquilo que os olhos veem
se alteram consoante a quantidade e qualidade das variáveis implicadas no
processo – tais como a cultura, o conhecimento, e coisas assim…sem importância…(apetece-me
ser irónica).
No entanto,
relativamente àquilo que não se vê, gostaria de deixar aqui uma ressalva que,
valendo pouco por ser minha, é aquela em que acredito: Tanto valor existencial
tem a existência como a não-existência de tudo o que não se vê.
Na verdade, a
existência de Deus, do espírito, da alma, e por aí fora, bem como a sua não-existência,
dependem exclusivamente da Fé. Ter Fé em Deus é acreditar na sua existência e
é, portanto, ter Fé na sua existência. Não ter Fé em Deus é não acreditar na
sua existência e é, portanto, ter Fé na sua não-existência.
Tudo é,
portanto, uma questão de Fé.
E, convenhamos,
que tão arreigados são alguns defensores do SIM, como do NÃO.
Ainda que nenhum
deles consiga provar ao outro a sua razão na medida em que ainda não somos
totalmente capazes de transformar o invisível em visível. Ainda…
Há contudo,
algo que me tranquiliza ao mesmo tempo que me perturba. É que aqueles que SABEM
que Deus existe, já o SENTIRAM, de uma forma ou de outra. Já o ENCONTRARAM
dentro de si e nos outros. Já COMUNICARAM com Ele. Enquanto aqueles que SABEM
que Ele não existe, nunca tiveram contacto com nada que lhes tivesse comunicado
isso mesmo. Simplesmente, nunca tiveram contacto com Ele – ou pensam que não
tiveram -, e limitam-se a NÃO ACREDITAR. E isto faz uma grande diferença. E faz
uma grande diferença porque Ele está dentro de todos e de cada um de nós e só
não o SENTE, e só não o ESCUTA, e só não o VÊ quem anda distraído com o imediato,
quem anda distraído com o supérfluo, com o temporário. Ou quem faz disso um
verdadeiro cavalo de batalha porque acredita que tudo o que é verdade terá de
ser reconhecido pela razão.
Nada disto
seria problemático se não fosse fonte de tantas discórdias e, sobretudo, de
tanta ânsia de aproveitar ao máximo tudo o que há porque um dia acaba e mais
vale aproveitar enquanto por cá se anda.
Nada disto
seria problemático se não exaltasse o egoísmo e não virasse de pernas para o ar
todos os valores que são verdadeiramente HUMANOS – aqueles que nos distanciam
dos animais que trazem à flor da pele a necessidade de satisfazer os seus instintos,
como o de sobrevivência, e os seus chamados sensoriais.
A diferença. A
grande diferença. Entre aqueles que SABEM que Deus existe e aqueles que SABEM
que Ele não existe é o comportamento de uns e de outros.
Quem SABE que
Deus existe já sentiu o Seu AMOR e SABE que não há nada mais poderoso no
Universo que essa LUZ, essa ENVOLVÊNCIA, essa VERDADE que é o AMOR de Deus.
Quem SABE que
Deus não existe, NÃO SABE nada disto, porque nunca se deu a si próprio a
oportunidade de se auscultar no mais profundo do seu ser, de viajar até ao
interior da sua alma para falar com Ele.
E não, não
estou a falar de religiões. Estou a falar da existência de Deus.
Infelizmente
há, no interior das várias instituições religiosas, os que SABEM que Ele existe
e aqueles que FINGEM SABER. Por isso é que as coisas são como são.
Não vale a
pena entrar para uma instituição religiosa à procura de Deus. Ele não está lá.
Ele está dentro de cada um de nós.
Só depois de o
encontrarmos aí, é que vale a pena ingressar numa instituição – aquela para onde
Ele nos chamar. Porque Ele chama, não tenham dúvidas. Ele chama quem o
ENCONTRA. Quem o ENCONTRA dentro de si. Porque não vale a pena procurá-Lo com a
razão – nunca O encontrarão. Ele está muito para além disso – Ele está nos
númenos de Kant. Está na nossa alma. Está na nossa fé porque, afinal, é tudo
uma questão de Fé. Tudo. Por mais contas que se façam, é tudo uma questão de
Fé.
E porque
haveriam vocês, os não crentes, de andar à procura de algo que SABEM que não
existe?
Bom, quando
mais não seja para poderem provar isso mesmo.
Quem tem
certezas não tem medo de nada e, portanto, entrega-se à vida de alma e coração.
Ser capaz de “olhar
para dentro” de nós mesmos; de refletir sobre a nossa vida; de questionar o que
nos aconteceu e a forma como lidámos com o que nos aconteceu. Ser capaz de “desviar”
os olhos do que é palpável e tentar ver para além disso, como quem vê para além
da ténue neblina que se forma ao longo do alcatrão num dia quente de Verão ou o
que está para lá da luz do sol refletida pela neve. Tudo isso faz parte de uma
entrega total à vida.
O tempo gasto
freneticamente com “coisas” é uma fuga à própria vida.
Quem se recusa
a refletir. Quem não é capaz de se isolar por algumas horas para ouvir a voz
que lhe vem de dentro foge freneticamente da vida.
Quem é capaz
de fazer isso. Quem faz dessa reflexão uma prática constante. Mais cedo ou mais
tarde, encontrará Deus.