Não é que eu não goste de sexo,
que gosto, mas vim o caminho todo a pensar nas trouxas d'ovos só porque ele as
esqueceu para se deixar ficar preso ao sexo. Em que é que estás a pensar,
perguntei eu, em sexo, respondeu ele, as trouxas d'ovos já eram. A esta hora
não me apetecem.
Mas o que é que sexo e trouxas
d'ovos têm em comum, perguntam vocês. Nada. Rigorosamente nada, a não ser,
talvez , o desejo de alguém que se interessa por ambas, e apenas por ambas, e
de tal forma que tanto se lhe dá que venham com hortelã e passas ou a nu,
limpinhas, sem nada, só as trouxas feitas d'ovos, como o sexo sem mais nada,
sem a confusão do gostas de mim, telefonas-me amanhã ou voltamos a ver-nos.
Nada disso a não ser, é claro, se for para partilhar uma ou duas trouxas
d'ovos.
Conheço o Francisco há 30 anos e
ele foi sempre assim - mais coisa menos coisa. Confesso que a idade tem feito
desabrochar o gentleman que vive nele. É um tipo com pinta, lá isso... Um cineasta. Um romântico acidental que é
como quem diz, um romântico capaz de transformar um momento em "aquele
momento", desaparecer no dia
seguinte e ficar sem dar notícias meses a fio, mesmo que a sua vontade fosse
levar-nos com ele. Um tipo capaz de
abanar corações mas que acaba por sair com o dele partido depois de uma série
de peripécias e malabarismos difíceis de compreender. Hoje perguntei-lhe o que
é que ele queria, o que é que ele realmente queria da vida e ele respondeu-me
tout court: sexo e trouxas d'ovos.
Deixou-me de boca aberta não pela
surpresa ou desilusão ou seja lá o que for que a resposta pudesse ter
despertado em mim, mas pela beleza da frase! Temos isso em comum, creio eu,
esse desligamento do que é complicado , essa tendência para ficcionar a vida em
imagens, mesmo que essas imagens sejam de palavras e que as palavras, no fim,
não queiram dizer grande coisa. Na verdade, se forem harmoniosas pouco importa
o que querem dizer, têm de ser usadas - num título, num verso, numa história ou
numa crónica desinteressante de conteúdo como esta mas honesta e, espero, fácil
de ler. Harmoniosa, como se quer - no ritmo, nas imagens, nos desafios que as
palavras, e só elas, nos oferecem.
Sexo e trouxas d'ovos podia muito bem ser o título de um romance ou
de um filme. E fossemos nós o país dos subsídios, que já fomos, a esta hora em
vez de estar eu para aqui a desencantar palavras para vos dar, estaria o
Francisco a desencantar imagens, sequências de imagens, provavelmente sem
história - como esta crónica -, para vos oferecer uns minutos de sexo e trouxas
d'ovos. Mas os subsídios acabaram, pelo menos aqueles que davam para fazer
cinema, principalmente agora que o Manoel de Oliveira já cá não está, e alguém
tinha de aproveitar a frase. Aproveitei-a eu.
2 comentários:
E aproveitaste muito bem a frase minha querida Amiga... com aquele teu jeitinho bom de lidar com as palavras, como só tu sabes fazer.
Não direi um filme, que para isso é preciso muita "coisa", com tudo o que a palavra"coisa", significa. Mas talvez aproveitar a ideia e escrever um livro com o título "Sexo e trouxas de ovos".
Um abraço
João
~ ~
~~~ ll: ))
~~ Um poema com um verso apenas...
~~~~~~~~~~~ Beijinhos. ~~~~~~~~~~
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