segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Vim aqui para falar de orgulho


Não do orgulho que é suposto ter-se quando algo em nós deveras sobressai, mas daquele orgulho teimoso, que prevalece quando tudo à sua volta grita pela razão. Que fica, quando nada mais lhe resta senão ele próprio.

Vim aqui para dizer que reconhecer o disparate que inadvertidamente nos saiu da boca para fora é sinal de inteligência e que, tentar corroborá-lo desalmadamente com outros disparates exponencialmente maiores, não é.

Mas, no caminho para cá, dei de caras com este vídeo que a minha filha postou no blogue dela e, apesar de não querer, de forma nenhuma, deixar de dizer o que aqui vim dizer, tudo em mim gritou a urgência que este pequeno vídeo encerra, nos mais pequenos como nos maiores detalhes.

O mundo ao contrário seria tão mau quanto aquilo que agora é. E a transferência de orgulhos desajustados, reveladores de fraquezas maiores e terrores do que não se conhece, seria tão estúpida quanto aquilo que agora é.

No entanto, e como acredito deveras na humanidade, creio que a dramatização de um mundo ao contrário só serve para tentar, TENTAR, abrir os olhos daqueles que continuam a acreditar que Deus não só os fez primeiro, como o que fez depois foi deles que saiu.


quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Não tenho nada contra os ricos. Já contra os pobres, não posso dizer o mesmo




Hoje comemora-se o dia mundial da Justiça Social, o que equivale a dizer que se comemora uma coisa que nunca existiu. Talvez seja esse facto que transforma em palhaçada estes Dias Mundiais das Coisas Que Ainda Não Aconteceram E Que Não Se Sabe Se Algum Dia Acontecerão.
Eu, pessoalmente, não tenho nada contra os ricos. Muito pelo contrário – acho que todos deveríamos ser um deles. Já contra os pobres não posso dizer o mesmo – não gosto deles nem um bocadinho e acho, sinceramente, que deveriam ser erradicados o mais rapidamente possível.
Mas, neste universo, passam-se coisas que não nos passam pela cabeça ou, mesmo que o façam, é em forma de anedota, pelo que nós, os mais pequenos e em número maior, andamos não só às aranhas mas também a apanhar bonés, como se costumava dizer há alguns anos atrás.
O raciocínio mais rápido, e fácil, é acreditar que os pobres continuam a existir porque isso faz dos ricos mais ricos, tratando-se assim de uma grande injustiça social (talvez o dia de hoje devesse ser precisamente o Dia Mundial da Injustiça Social). Contudo, há algo que me confunde – dado que o dinheiro não é uma dádiva da natureza mas um recurso inventado por nós para nos facilitar a vida, por que carga de água não se adaptam as suas leis ao crescimento da população e não se zela para que todos possamos ter uma vida boa – note-se que eu escrevi Boa e não Digna. É que Digna é outra coisa. Não basta ser rico para se ser digno.
Esse raciocínio deixa-me sempre uma certa estranheza – se fossemos todos ricos ninguém precisava de andar a olhar por cima do ombro para que nada lhe acontecesse; toda a gente podia gastar dinheiro em barda, pelo que a economia prosperaria, e muito! Dir-me-ão: Mas os ricos perderiam uma coisa que lhes é preciosa – o Poder. A questão é: será que o têm mesmo? Serão eles os seus detentores? Seremos nós, habitantes deste pequeno calhau – o terceiro a contar de um dos milhares de sóis existentes por esse universo fora -, detentores de qualquer tipo de Poder? Ou existirão “mais coisas entre o céu e a Terra do que sonha a nossa vã filosofia”?

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Boçalidades


Já uma vez escrevi aqui sobre aquilo que nos move. Hoje apetece-me escrever outra vez.
Ultimamente tenho andado a fazer um certo esforço para compreender o porquê de defender isto e não aquilo; de pensar isto e não aquilo; de sentir isto e não aquilo. Tenho chegado à conclusão que, se não sempre, pelo menos na maioria das vezes, as minhas filosofias se prendem, tão só, àquilo que eu sou, aos meus interesses. Considerando que sempre que algo me faz mal – me faz, fisicamente mal -, vai contra os meus interesses.
Daí que me tem parecido cada vez mais despropositada esta mania que as pessoas têm de quererem vender o seu peixe ao alheio quando o que o alheio é se distingue de si. E tão mais disparatada é, quanto maior a distinção.
O que nos falta, em grande quantidade, é conhecimento. A uns o conhecimento do mundo, a todos o conhecimento de si.
Perguntarmo-nos o porquê do que nos acontece e da forma como reagimos aos outros e ao ambiente, seria uma atitude deveras inteligente e poderia até constituir um belo de um trampolim para um mundo melhor, mais humano, mais civilizado. Isso, ao invés de optarmos pelo mais simples – a certeza de que tudo o que é mau vem de fora e de que aquilo que nos motiva é um bem maior para o mundo em geral, sem pararmos um bocadinho para pensar que, se calhar, será um bem maior para cada um de nós em particular. Isto, já para não falar nas invejas, nos ódios de estimação ou nos traumas que, de tão afundados, já esquecemos mas nos servem de motor.
Eu, por exemplo, gostaria muito que alguém se mexesse (porque eu não estou para isso) para reabilitar este lugar para onde vim viver e que faz a vergonha de qualquer cidadão mais civilizado. A degradação causada pela profunda ignorância de tudo o que é civilidade, de grande parte daqueles que por cá vivem, transforma um lugar que poderia ter os seus pitorescos encantos, num lugar degradado, sujo, velho e feio. Constituído por algumas quintas consideradas, quer por quem nelas não vive quer por quem as habita, mundos à parte, o resto é lixo, salvo honrosas exceções de menos de uma meia dúzia de pessoas que, como nós, precisam de uma certa harmonia à sua volta.
Ora, porque é que eu gostaria de reabilitar este lugar? Porque sou uma pessoa muito boa e acredito que, uma vez reabilitado, faria mais felizes todas as pessoas que por cá vivem, mesmo aquelas que nem sabem o que isso é?
Claro que não! Eu gostaria de o reabilitar porque é o lugar onde EU vivo. Porque detesto ter de passar por uma rua degradada para chegar à minha e porque não aguento mais à boçalidade de certos vizinhos.
Em suma, o interesse tem, na verdade, uma raiz particular e egoísta como, aliás, todos os interesses. Não quer isto dizer que não sejam interesses válidos, obviamente. Mas é importante que sempre que os manifestemos tenhamos a coragem de assumir a sua proveniência em vez de tentarmos, a toda a hora, atirar areia aos olhos dos outros, e aos nossos – principalmente aos nossos!
 
 

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Leve dissertação sobre interesses, justiça e honestidade


“Dar a albarda conforme o burro” é um dito muito antigo. Pelo menos suficientemente antigo para eu o ouvir desde criança da boca da minha mãe.
Nunca o pus em causa. Como, de resto, não pus em causa, ao longo da minha vida, tantos outros ditos antigos. Errado. Devemos pôr em causa tudo o que ouvimos. Partir do princípio que, pelo facto de ser antigo e repetido, corresponde à verdade, é evolutivamente negativo (tantos ivos numa só frase pode parecer descabido, mas não é).
"Dar a albarda conforme o burro" implica adaptarmos os nossos comportamentos aos comportamentos alheios, o que faz com que sejamos apenas sombras.
Imaginem, por exemplo, alguém afirmar que é honesto sempre que, para com ele, há honestidade. Portanto, esta pessoa é honesta exceto quando não é. Onde está então a honestidade? E quem diz honestidade diz outra caraterística qualquer – eu sou paciente, exceto quando não sou. O que eu sou depende, portanto, daquilo que me parece que os outros são para comigo. É que nem depende do que eles na verdade são, mas do juízo que eu faço deles. Porque tudo o que os outros são nos chega turvado pelos juízos que deles fazemos.
“Dar a albarda conforme o burro” é um dito antigo que deve ser aplicado em benefício alheio ou, na melhor das hipóteses, em benefício mútuo. Mas nunca em benefício exclusivamente próprio. Aliás, como todas as coisas que são verdadeiramente honestas, ele deve ser usado justamente e não interesseiramente. Deve ser usado, por exemplo, na comunicação, de modo a que a mensagem chegue o mais intacta possível ao recetor. Aí sim, deve-se “dar a albarda conforme o burro”. No que toca a características humanas, elas devem ser nossas, estar agarradas a nós como lapas às rochas e nenhuma desonestidade alheia deve ser capaz de as mover. Isso sim, é ser-se.
 

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Em frente ao espelho


Não sei se existe uma tendência geral para insistir nos mesmos passos, como quem quer todos os dias resgatar o passado, ou se sou só eu. Mas creio que não. Não estarei sozinha neste particular, até porque ninguém quer estar sozinho quando se trata de questões mais complexas. Aliás, na verdade ninguém gosta de se sentir único nos defeitos. Já nas virtudes...

Daí que, em frente ao espelho, fixos em imagens que já não existem, desviando os olhos de qualquer sinal de novidade, recriam-se momentos, situações, valores, como quem, estando parado,  finge que anda.

Ignorando, ou supondo ignorar, a verdadeira alma da palavra “novo”, busca-se constantemente o que nunca chegou a ser – destino fatal para tudo o que é imitação. Mesmo que não o saiba, ou sabendo, tanto faz.

Romper com o passado é o caminho para quem procura paz de espírito.

Não um romper romper, de quem vira a cara sempre que se cruzam. Não um romper de quem deixa de falar ou de quem está muito, mas mesmo muito, zangado, não.

Antes um romper tranquilo, de quem ama e acarinha mas sabe que já passou. Um romper de quem agradece mas sabe que é hora de seguir, de avançar para a construção de novos passados.

Um romper de quem perdeu o medo, abriu os olhos, olhou o espelho, e seguiu em frente.

Esse romper.



segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Trabalho é trabalho


Por muito que se goste daquilo que se faz, e eu gosto, há sempre dias em que nos apetece fazer outra coisa qualquer ou mesmo nada.

Dizer que trabalhamos por amor à camisola, independentemente daquilo que se ganha, é falso, estúpido e serve para alimentar essa mentalidade servil de que o trabalho dá saúde, honra e prestígio. Às vezes dá. Às vezes não. E se não precisássemos de ganhar dinheiro, com certeza não faltariam atividades, às quais não chamaríamos trabalho, que nos dessem prazer e fossem muito mais proveitosas socialmente do que o trabalho que fazemos por não haver outra forma de pagar o supermercado.

Dentro deste contexto, haver quem se ache no direito de beneficiar do trabalho alheio sem para isso ter de pagar o justo custo, desvalorizando não só o trabalho em si como as necessidades primárias de cada um, i.e, a sua inerente condição humana, é não só vergonhoso mas ofensivo e criminoso.

A escravatura, abolida há séculos, renasce assim nos hábitos daqueles que, tendo muito ou menos que isso mas o suficiente, passam por cima de “toda a palha” para satisfazerem as suas necessidades secundárias e manterem, à custa seja lá do que for, o nível de vida ao qual se acham no direito.

A esses, desejo sinceramente que, sem qualquer possibilidade de controle, cada cêntimo que deixam de pagar a quem de direito lhes caia por um qualquer cano e desapareça no espaço. Desejo ainda que essa realidade seja tão imediata que não deixe qualquer tipo de dúvida relativamente à sua causa – não paga, perde -, assim, sem mais nem menos; sem dó nem piedade e na mesma proporção – são cêntimos, perde cêntimos; são milhões, perde milhões. Isto sim, é justiça.