quinta-feira, 3 de julho de 2014

A Verdade - isso é o quê?



Há muitos anos eu estava convencida que existia uma verdade e que ela era, evidentemente, a minha.

Depois, à medida que os meus horizontes se foram expandindo, cheguei a temer uma grave inconsistência da minha pessoa.

Todas as opiniões, por díspares que fossem, que ouvia sobre um qualquer assunto me pareciam lógicas e verdadeiras.

Nessa altura perdi a minha verdade! Eu era, na minha opinião, uma pessoa despersonalizada, meio tonta, sem opinião firme sobre fosse o que fosse.

A qualquer verdade afirmada por terceiros eu encolhia os ombros e o meu olhar tornava-se tão vago quanto a minha opinião - eu não sabia. E, perante a veemência dos outros, eu só conseguia responder: Pois...não sei...talvez...

Hoje, convicta de que a única verdade é que não existe nenhuma verdade única, procuro a minha mais do que a de qualquer outra pessoa e procuro-a com o meu coração e não com a minha razão.

A razão, que geralmente tende, primeiro a acreditar no que é mais fácil para nós e depois a gerar argumentos que sustentem precisamente isso. Isto é, a razão obedece muito mais ao comodismo, que é como quem diz -  joga à defesa, enquanto o coração sabe. Ele é que sabe!

Quantas e quantas vezes a razão puxa para um lado e o estômago dá voltas e voltas? Sabem porquê? Porque o coração sabe que não é por aí. Mesmo quando tudo à nossa volta grita que sim, que é, se o nosso estômago dá voltas, se os intestinos se prendem, ou soltam, se a voz embarga...se calhar é porque não é por aí.

As verdades são tantas e tão convincentes!

Há pouco tempo vi um filme sobre Madre Teresa de Calcutá. Chama-se "A Verdade Sobre Madre Teresa" ou qualquer coisa do género...

Nunca me passou pela cabeça aquele ponto de vista mas, tal como o seu oposto, ele faz sentido. Afinal Madre Teresa foi a mulher que mais dinheiro geriu, em toda a história da humanidade. Então, porque é que os seus pobres continuaram sempre pobres? Parece-me uma pergunta lógica. Aliás, porque é que os seus pobres continuam pobres quando aquelas que ficaram à frente da Congregação dizem que o dinheiro que esta tem é incontável?!

Mas, por outro lado, a senhora dedicou uma vida inteira aos pobres. Afinal, ela recebeu o Nobel da Paz! E nunca ninguém a viu rica! Será que ela foi, como diz o tal filme, mais um instrumento de acumulação de riqueza para o Vaticano?

E quem é que pode responder a isto com verdade?

Ninguém! Só ela o poderia fazer e ela já cá não está!

A verdade é uma propriedade individual! O resto são pontos de vista.

Descubra a sua verdade.

E siga o seu próprio caminho.

Quando o estômago lhe doer, concentre-se nessa dor para ter a certeza de que não é medo. Depois oiça o seu coração e aceite a sua verdade mesmo que ela seja diferente de todas as outras.


Aceite-a porque ela é a SUA VERDADE.



quarta-feira, 4 de junho de 2014

Emoções


Não é bom escrever ao sabor das emoções.

As emoções são o resultado de estados de alma que devem ser vividos até às últimas consequências. 

Devem ser deixados livres para se entranharem em nós até ao âmago, até ao tutano dos ossos, em cada célula do corpo de modo a dissolverem-se por completo. 

E depois, só depois, podem ser ditas.

Até lá, é deixar que doam.


segunda-feira, 26 de maio de 2014

Este texto é para menores de 50 (não estou com disposição para ouvir a lenga-lenga que eu própria costumo fazer sempre que alguém mais novo faz referência à sua provecta idade)



Nasci há 56 anos. Para ser franca hesitei no número o que não me parece um bom sinal.

No entanto, sinto mais orgulho do que lástima.

56!

Há dias em que não sei como é que vim aqui parar. 

Há dias em que não sei como aqui cheguei e nem me interessa. 

Cheguei e pronto. 

Cheguei.

Estou cá e estou bem. 

Na verdade estou cada vez melhor.

Estou mais descontraída.

Não há muito tempo acordava com o coração a saltar-me do peito. 

Tinha ataques de pânico constantes. 

Aliás, a minha vida era um ataque de pânico. 

Agora, olho à minha volta e sei, e sinto, e tenho a certeza, e vivo essa certeza, de que não há nada que me possa acontecer que não seja vida.



terça-feira, 20 de maio de 2014

O mito grego e a realidade tuga





É difícil trabalhar neste país. E como é difícil viver sem trabalhar – ou pelo menos sem ganhar dinheiro -, é difícil viver neste país. O que é triste, porque é um lindo país, mesmo sendo um lugar onde ninguém reconhece o valor de ninguém.

Creio que não estou sozinha quando digo que me sinto como Sísifo quase todos os dias.

Sísifo, para quem não sabe, é um personagem da mitologia grega que está condenado a repetir sempre a mesma tarefa – empurrar uma pedra gigante montanha acima -, o facto é que cada vez que está prestes a chegar ao topo, uma qualquer força irresistível leva a pedra de volta ao ponto de partida anulando completamente todo o esforço despendido pelo desgraçado.

Não é só o dinheiro, mas é também o dinheiro. É o dinheiro, o reconhecimento, o respeito e a gratidão que vem com ele. Trabalhei dois anos na Holanda e apesar de trabalhar mais horas do que as que aqui trabalho, nunca me senti tão cansada como me sinto aqui. Não é o esforço exigido pelo trabalho, é a frustração que vem com a dúvida de competência:

Será que presto para alguma coisa? Em que é que as competências que acredito ter se assemelham àquelas que os outros vêem em mim?


Este país é ingrato. Nós somos ingratos, pedantes, pretensiosos. Olhamo-nos uns aos outros por cima do ombro. Somos um país de gente frustrada e não compreendemos, ainda, que somos simultaneamente vítimas e carrascos.

Voltando ao mito de Sísifo faz sentido referenciar Camus e a sua filosofia de absurdo na qual este mito é evocado – Será que a realização do absurdo exige o suicídio, pergunta Camus e responde, quase de imediato, “Não, exige revolta”.

E o absurdo é, por exemplo, sermos tratados abaixo de cão no nosso próprio país e como profissionais competentes nos países dos outros. O absurdo é sermos pagos abaixo do que é digno no nosso próprio país e com a dignidade que merecemos nos países dos outros. Isto sim, é absurdo.



segunda-feira, 19 de maio de 2014

O que É e o que PARECE


Não faço juízos a priori e nem no imediato porque posso estar a ver mal, posso estar a ser induzida em erro pelos múltiplos factores que nos influenciam a todo o momento. 

Das pessoas vou registando palavras e actos, estados de espírito, olhares – concordância entre uns e outros -, e tiro as minhas próprias conclusões que raramente são definitivas ou levam bastante tempo útil para o ser. 

Dos acontecimentos acabo por não tecer juízos, fico-me pelas ideias, pelas sensações, pelo instinto, porque não existem dois acontecimentos iguais. A verdade é que a vida, ao contrário do que corre em tantas bocas, surpreende-nos a todo o momento a não ser, é claro, que já dela esperemos aquilo que achamos que é o esperado – aí, não haverá lugar a surpresas. Não nos maravilharemos, muito pelo contrário, a maior parte das vezes desiludir-nos-emos porque as expectativas estão sempre além da realidade. 

Fazer de cada momento uma novidade é abrir o coração a surpresas e fechá-lo a desilusões. As coisas serão o que forem e nós poderemos vivê-las com alegria porque não há outra forma de viver o novo. 

Muitos me chamam à atenção para o facto de eu acreditar nas pessoas. Sei que a intenção é boa mas divirto-me a perceber duas coisas: a primeira é que eles acham que é por inocência ou sonho; a segunda porque temem por mim, acreditando que estou mais sujeita a ser enganada. 

Eu nunca sou enganada, porque a única pessoa que me pode enganar sou eu mesma e eu esforço-me, todos os dias, para que isso não aconteça. Para, sem medo, enfrentar dentro de mim o que tiver de ser enfrentado. 

Quanto às mentiras dos outros elas são, grosso modo, falta de coragem e não se pode condenar a falta de coragem, apenas lastimá-la. E quando a intenção é má, verdadeiramente má, ela é tão detectável que a mentira se denúncia na hora com uma tal clareza que a situação, por caricata, acaba por ser divertida. 

Sosseguem pois os que por mim temem. Nada há a temer. Eu sou forte (no bom sentido, claro).


sexta-feira, 16 de maio de 2014

Hoje foi dia de pendurar quadros.

Já perdi a conta às vezes que pendurei estes quadros. Sempre os mesmos. Quase sempre nos mesmos lugares, obedecendo a uma só filosofia; à mesma lógica ou cultura familiar.

Hoje mudei de estratégia. Até porque está mais do que provado que a habitual não me tem trazido sorte – pelo menos não a sorte que eu esperava. Hoje mudaram de lugar. Enfim, nem todos, mas a maior parte deles.

Para companhia escolhi um cavalo bestial. Li há pouco tempo que é o meu animal de poder. Devia ter também um quadro com um urso, já que é o meu animal de proteção.

Ao que parece, ao cavalo vou buscar poder e liberdade. O poder vem da sabedoria encontrada dentro do Ser, resultado da sua jornada – o que faz todo o sentido.

Quanto à proteção, parece estar ligada ao desejo de hibernação – um desejo antigo, que eu sempre tive -, à necessidade de retiro para recuperar forças.

Infelizmente a vida não se compadece com as minhas necessidades e é por isso que eu estou empenhada em transformá-la de forma a não precisar do seu compadecimento. Já faltou mais e, nessa altura, serei urso sempre que precisar de o ser. Ou ursa, que é mais adequado.

O curioso é que sempre gostei de cavalos e, quanto aos ursos, uma vez tive um namorado que me tratava por ursa, de forma muito carinhosa evidentemente. Sempre acreditei que era por causa do cabelo.

Mas hoje foi dia de pendurar quadros e ao contrário de todos os outros dias de pendurar quadros, não stressei nem me preocupei com a sua distribuição. Ao contrário de todos os outros dias de pendurar quadros, hoje estou descontraída, paciente e confiante.


Aqui para nós que ninguém nos ouve – a minha vida está a mudar. Fechou-se um ciclo. Para a frente, tudo será como eu quiser.


terça-feira, 6 de maio de 2014

Tesouros

Há tesourinhos que mesmo que deprimentes se arrastam pela vida fora nas sucessivas mudanças de casa, ou de lar, que pode não ser exactamente o mesmo.

Os meus, não sendo revisitados com regularidade, não sei já se são ou não deprimentes – ser deprimente é um critério que muda com o avanço do tempo – ontem foi, hoje já não, sendo que o contrário é tão válido quanto este.

Adivinharam – mudei de casa. Novamente. A vida é, preciso de acreditar, mesmo assim – para ser vivida em toda a sua plenitude. E apesar da paz e do sossego serem uma ambição, não podem ser conseguidos a qualquer custo – aliás, não podem custar nada, têm de ser parte integrante do pacote, ou este não valerá a pena.


Nestas minhas andanças tenho arrastado comigo três ou quatro pequenas caixas, dois diários e muitos manuscritos. Mas, importantes mesmo, são as caixas e os diários que me acompanham desde a infância – sim, infância. Não adolescência ou juventude, mas infância. Lá guardo, religiosamente, bilhetes de autocarro de 2$50, capicuas preciosas que dão sorte na vida. Lá guardo uma noz de três quinas e um rabo de coelho que me foi dado por um apaixonado para que, mais uma vez, me desse sorte. Lá guardo cartas e cartinhas de amigas que me marcaram para a vida, ou as suas cartas não fariam parte do rol. E lá guardo mais uma série de pequeníssimas coisas que já não sei, não me lembro, porque nestas andanças nem tempo tenho para as revisitar. Mas que as guardo, guardo, e por muitas que sejam as coisas de que me vou desfazendo, estas ficam, sabe Deus porquê...Provavelmente para me darem sorte.


quarta-feira, 23 de abril de 2014

Este país da Boa-Vontade...

Uma escola de Leça da Palmeira fornece, há 20 anos, voluntários para, na Junta de Freguesia, ajudarem cerca de 80 pessoas por dia a preencher o IRS.

Somos o país do voluntariado – o que só nos ficaria bem, não fossemos também o país dos desempregados e dos mais mal pagos.

O que é que aconteceria se estes voluntários não existissem e estas pessoas – os infoexcluídos que, ao que parece, são ainda muitos -, não entregassem a declaração do imposto por estes motivos? Será que o Fisco os castigava a todos, ou o governo seria obrigado a resolver o problema pagando a quem de direito para os ajudar?

Até que ponto é que esta nossa boa vontade funciona a nosso desfavor? Até que ponto é que estes jovens, sem emprego a maioria, e sem dinheiro, cava a sua própria sepultura com esta predisposição para o voluntariado?

São questões que, ultimamente, me têm assolado bastante, até porque, eu própria sou, de vez em quando – e cada vez menos -, uma voluntária.

É que isto de trabalhar à borla tem duas facetas – a da ajuda a quem verdadeiramente precisa, e a do aproveitamento ilícito de quem não precisa de borlas para nada mas as aproveita para encher, mais ainda, os próprios bolsos. Se calhar convinha começar a separar o trigo do joio. Sempre ouvi dizer que “a quem muito se baixa o cu lhe aparece” e nós somos um povo demasiado habituado a mostrar o dito.


terça-feira, 8 de abril de 2014

E nada de mal me acontecerá

Perco-me na espera de dias melhores que hão de vir na força do calor e da paz que, por andar perdida, tarda em chegar.

Perco-me na esperança de dias melhores que hão de chegar engalanados, garridos, ao som do rufar das peles esticadas dos taróis.

Perco-me na certeza de dias melhores acabados de chegar. Perco-me no seu sabor, não de mel que é espesso, denso, mas de limão doce e fresco, suave, envolto em bolas de sorvete branco enfeitadas com pepitas de chocolate. Perco-me nesses dias mornos, envolta nos teus braços que sei seguros.

E nada de mal me acontecerá. Nunca mais.


sábado, 29 de março de 2014

Génio Precisa-se

As crendices, mas também o génio, ficam sempre mais arreigados em períodos de grande aflição, de crise profunda, de desnorteio, terror e sofrimento.


Bons exemplos disto são a Idade Média e o Renascimento, sofrivelmente retratados na série “Os Demónios de Da Vinci”. Foi, porém, essa mesma série que me despertou a vontade de escrever sobre isto já que ao observar a ignorância em que se vivia e o terror por ela despertado; ao observar o poder que advém do conhecimento quase exclusivo, senti que nos tempos que correm o medo está a voltar porque a ignorância, ainda que a outro nível, afinal mantém-se. Porque o conhecimento, agora exigentemente muito mais vasto, contínua a ser símbolo de poder e a permanecer quase exclusivo.


De pouco serve, ao que parece, termo-nos transformado em povos mais cultos se a cultura que nos têm vendido nos molda a seu favor. De pouco serve se nos continuam a esconder conhecimento – e continuam. Tal e qual como na Idade Média. Mas, pior do que isso é este retorno vestido de cores um pouco mais garridas. Este retorno do medo; das crendices; das doenças endemoniadas. Este desespero que nos faz recorrer de tudo o que promete alívio – ainda que fugaz. E o desespero que passa por cima do desespero alheio – que esquece moral, que esquece ética, que esquece amor, amizade, virtude, confiança, carinho...que esquece tudo porque só se lembra da dor, do sofrimento e corre, corre por cima de tudo e de todos os que se atravessarem à frente e busca, cheira, como um predador, a aflição alheia para dela se aproveitar.


Se isto não é um regresso ao pior que Idade Média teve para nos oferecer, não sei o que será.

Eu, rezo para que o novo Renascimento chegue - se não a tempo para que eu dele desfrute, ao menos para os meus filhos. Que o novo Renascimento chegue ainda no tempo dos meus filhos. Porque se a História se repete - e tudo indica que sim -, vai haver um dia em que ele chegará.


segunda-feira, 24 de março de 2014

Toca mas é a acordar!

A História é feita de pequenas histórias que se vão sucedendo num tempo e num espaço que, afinal, nos são alheios ou nos passam despercebidos. Centramo-nos no nosso – tempo e espaço – e lá mumificamos, nascendo, vivendo e morrendo sem nos termos praticamente mexido. Os mesmos. Sempre os mesmos. Crédulos num destino incontornável; conformados com todas as realidades que nos são oferecidas - a maior parte das vezes sem nos consultarem, sem saberem, até, de que é que gostamos, com que é que sonhamos - ; presos por “verdades” que não são as nossas, sendo que essas ou já esquecemos ou nem sequer chegámos a lembrar.

Até que ponto adormecemos nas constantes distracções do dia-a-dia? E se Jesus Cristo tivesse razão? E se nós fossemos muito mais do que isto? E se, dentro de cada um de nós existisse, latente, o divino?


terça-feira, 18 de março de 2014

O grito do Ipiranga em versão tuga

A vida não está nada fácil e o dinheiro, que é cada vez mais escasso, parece composto de matéria volátil que se esvai em menos de nada - não há muito tempo cheguei mesmo a temer bolsos rotos mas depois percebi que nem todas as peças de roupa têm bolsos e que mesmo que os tivessem não é lá que guardo os parcos tostões com que me remedeio até ao final do mês.

Ora, como se isto não fosse suficiente, tenho à perna certas entidades credoras de somenos importância como, por exemplo, a ONEY e o seu cartão Jumbo+ cuja única e verdadeira vantagem é a de me poupar às filas intermináveis das caixas registadoras. Ora, estes simpáticos e prestáveis amigos a quem pago religiosamente todos os meses sem nunca – NUNCA -, em todos estes anos, que já são bastantes, ter deixado de o fazer, dizem-me agora que precisam que volte a preencher os papelinhos porque entendem, depois de uma análise cuidadosa não sei bem a quê, que talvez – TALVEZ -, eu constitua um risco financeiro.


Pois bem, dado que a vida, como comecei por dizer, não está nada fácil e o meu desejo de liberdade é cada vez maior, creio bem que será mais uma entidade à qual fecharei as portas, sendo que, devagarinho e ao ritmo das minhas possibilidades, as fecharei também ao banco com os seus cartões de crédito, de débito e do raio que os parta a todos, eu seja cãozinho se não for capaz de me libertar desta gente.

quinta-feira, 13 de março de 2014

E se...

...de repente, e finalmente, compreendêssemos e manipulássemos todas as possibilidades?

Se, de repente, e finalmente, conseguíssemos moldar o mundo, o nosso mundo, o mundo de cada um de nós, à nossa maneira, à maneira de cada um de nós?

Quão assustador isso seria?! Que monstruosa liberdade! Que insuportável responsabilidade!


O que faria cada um de nós se descobrisse, de repente, essa possibilidade? Descansaria tranquilo? Fugiria? Esconder-se-ia? Enrolar-se-ia sobre si mesmo? 

Ou, com toda a coragem e determinação, mudar-se-ia a si e ao seu mundo?

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Vim aqui para falar de orgulho


Não do orgulho que é suposto ter-se quando algo em nós deveras sobressai, mas daquele orgulho teimoso, que prevalece quando tudo à sua volta grita pela razão. Que fica, quando nada mais lhe resta senão ele próprio.

Vim aqui para dizer que reconhecer o disparate que inadvertidamente nos saiu da boca para fora é sinal de inteligência e que, tentar corroborá-lo desalmadamente com outros disparates exponencialmente maiores, não é.

Mas, no caminho para cá, dei de caras com este vídeo que a minha filha postou no blogue dela e, apesar de não querer, de forma nenhuma, deixar de dizer o que aqui vim dizer, tudo em mim gritou a urgência que este pequeno vídeo encerra, nos mais pequenos como nos maiores detalhes.

O mundo ao contrário seria tão mau quanto aquilo que agora é. E a transferência de orgulhos desajustados, reveladores de fraquezas maiores e terrores do que não se conhece, seria tão estúpida quanto aquilo que agora é.

No entanto, e como acredito deveras na humanidade, creio que a dramatização de um mundo ao contrário só serve para tentar, TENTAR, abrir os olhos daqueles que continuam a acreditar que Deus não só os fez primeiro, como o que fez depois foi deles que saiu.


quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Não tenho nada contra os ricos. Já contra os pobres, não posso dizer o mesmo




Hoje comemora-se o dia mundial da Justiça Social, o que equivale a dizer que se comemora uma coisa que nunca existiu. Talvez seja esse facto que transforma em palhaçada estes Dias Mundiais das Coisas Que Ainda Não Aconteceram E Que Não Se Sabe Se Algum Dia Acontecerão.
Eu, pessoalmente, não tenho nada contra os ricos. Muito pelo contrário – acho que todos deveríamos ser um deles. Já contra os pobres não posso dizer o mesmo – não gosto deles nem um bocadinho e acho, sinceramente, que deveriam ser erradicados o mais rapidamente possível.
Mas, neste universo, passam-se coisas que não nos passam pela cabeça ou, mesmo que o façam, é em forma de anedota, pelo que nós, os mais pequenos e em número maior, andamos não só às aranhas mas também a apanhar bonés, como se costumava dizer há alguns anos atrás.
O raciocínio mais rápido, e fácil, é acreditar que os pobres continuam a existir porque isso faz dos ricos mais ricos, tratando-se assim de uma grande injustiça social (talvez o dia de hoje devesse ser precisamente o Dia Mundial da Injustiça Social). Contudo, há algo que me confunde – dado que o dinheiro não é uma dádiva da natureza mas um recurso inventado por nós para nos facilitar a vida, por que carga de água não se adaptam as suas leis ao crescimento da população e não se zela para que todos possamos ter uma vida boa – note-se que eu escrevi Boa e não Digna. É que Digna é outra coisa. Não basta ser rico para se ser digno.
Esse raciocínio deixa-me sempre uma certa estranheza – se fossemos todos ricos ninguém precisava de andar a olhar por cima do ombro para que nada lhe acontecesse; toda a gente podia gastar dinheiro em barda, pelo que a economia prosperaria, e muito! Dir-me-ão: Mas os ricos perderiam uma coisa que lhes é preciosa – o Poder. A questão é: será que o têm mesmo? Serão eles os seus detentores? Seremos nós, habitantes deste pequeno calhau – o terceiro a contar de um dos milhares de sóis existentes por esse universo fora -, detentores de qualquer tipo de Poder? Ou existirão “mais coisas entre o céu e a Terra do que sonha a nossa vã filosofia”?

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Boçalidades


Já uma vez escrevi aqui sobre aquilo que nos move. Hoje apetece-me escrever outra vez.
Ultimamente tenho andado a fazer um certo esforço para compreender o porquê de defender isto e não aquilo; de pensar isto e não aquilo; de sentir isto e não aquilo. Tenho chegado à conclusão que, se não sempre, pelo menos na maioria das vezes, as minhas filosofias se prendem, tão só, àquilo que eu sou, aos meus interesses. Considerando que sempre que algo me faz mal – me faz, fisicamente mal -, vai contra os meus interesses.
Daí que me tem parecido cada vez mais despropositada esta mania que as pessoas têm de quererem vender o seu peixe ao alheio quando o que o alheio é se distingue de si. E tão mais disparatada é, quanto maior a distinção.
O que nos falta, em grande quantidade, é conhecimento. A uns o conhecimento do mundo, a todos o conhecimento de si.
Perguntarmo-nos o porquê do que nos acontece e da forma como reagimos aos outros e ao ambiente, seria uma atitude deveras inteligente e poderia até constituir um belo de um trampolim para um mundo melhor, mais humano, mais civilizado. Isso, ao invés de optarmos pelo mais simples – a certeza de que tudo o que é mau vem de fora e de que aquilo que nos motiva é um bem maior para o mundo em geral, sem pararmos um bocadinho para pensar que, se calhar, será um bem maior para cada um de nós em particular. Isto, já para não falar nas invejas, nos ódios de estimação ou nos traumas que, de tão afundados, já esquecemos mas nos servem de motor.
Eu, por exemplo, gostaria muito que alguém se mexesse (porque eu não estou para isso) para reabilitar este lugar para onde vim viver e que faz a vergonha de qualquer cidadão mais civilizado. A degradação causada pela profunda ignorância de tudo o que é civilidade, de grande parte daqueles que por cá vivem, transforma um lugar que poderia ter os seus pitorescos encantos, num lugar degradado, sujo, velho e feio. Constituído por algumas quintas consideradas, quer por quem nelas não vive quer por quem as habita, mundos à parte, o resto é lixo, salvo honrosas exceções de menos de uma meia dúzia de pessoas que, como nós, precisam de uma certa harmonia à sua volta.
Ora, porque é que eu gostaria de reabilitar este lugar? Porque sou uma pessoa muito boa e acredito que, uma vez reabilitado, faria mais felizes todas as pessoas que por cá vivem, mesmo aquelas que nem sabem o que isso é?
Claro que não! Eu gostaria de o reabilitar porque é o lugar onde EU vivo. Porque detesto ter de passar por uma rua degradada para chegar à minha e porque não aguento mais à boçalidade de certos vizinhos.
Em suma, o interesse tem, na verdade, uma raiz particular e egoísta como, aliás, todos os interesses. Não quer isto dizer que não sejam interesses válidos, obviamente. Mas é importante que sempre que os manifestemos tenhamos a coragem de assumir a sua proveniência em vez de tentarmos, a toda a hora, atirar areia aos olhos dos outros, e aos nossos – principalmente aos nossos!
 
 

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Leve dissertação sobre interesses, justiça e honestidade


“Dar a albarda conforme o burro” é um dito muito antigo. Pelo menos suficientemente antigo para eu o ouvir desde criança da boca da minha mãe.
Nunca o pus em causa. Como, de resto, não pus em causa, ao longo da minha vida, tantos outros ditos antigos. Errado. Devemos pôr em causa tudo o que ouvimos. Partir do princípio que, pelo facto de ser antigo e repetido, corresponde à verdade, é evolutivamente negativo (tantos ivos numa só frase pode parecer descabido, mas não é).
"Dar a albarda conforme o burro" implica adaptarmos os nossos comportamentos aos comportamentos alheios, o que faz com que sejamos apenas sombras.
Imaginem, por exemplo, alguém afirmar que é honesto sempre que, para com ele, há honestidade. Portanto, esta pessoa é honesta exceto quando não é. Onde está então a honestidade? E quem diz honestidade diz outra caraterística qualquer – eu sou paciente, exceto quando não sou. O que eu sou depende, portanto, daquilo que me parece que os outros são para comigo. É que nem depende do que eles na verdade são, mas do juízo que eu faço deles. Porque tudo o que os outros são nos chega turvado pelos juízos que deles fazemos.
“Dar a albarda conforme o burro” é um dito antigo que deve ser aplicado em benefício alheio ou, na melhor das hipóteses, em benefício mútuo. Mas nunca em benefício exclusivamente próprio. Aliás, como todas as coisas que são verdadeiramente honestas, ele deve ser usado justamente e não interesseiramente. Deve ser usado, por exemplo, na comunicação, de modo a que a mensagem chegue o mais intacta possível ao recetor. Aí sim, deve-se “dar a albarda conforme o burro”. No que toca a características humanas, elas devem ser nossas, estar agarradas a nós como lapas às rochas e nenhuma desonestidade alheia deve ser capaz de as mover. Isso sim, é ser-se.
 

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Em frente ao espelho


Não sei se existe uma tendência geral para insistir nos mesmos passos, como quem quer todos os dias resgatar o passado, ou se sou só eu. Mas creio que não. Não estarei sozinha neste particular, até porque ninguém quer estar sozinho quando se trata de questões mais complexas. Aliás, na verdade ninguém gosta de se sentir único nos defeitos. Já nas virtudes...

Daí que, em frente ao espelho, fixos em imagens que já não existem, desviando os olhos de qualquer sinal de novidade, recriam-se momentos, situações, valores, como quem, estando parado,  finge que anda.

Ignorando, ou supondo ignorar, a verdadeira alma da palavra “novo”, busca-se constantemente o que nunca chegou a ser – destino fatal para tudo o que é imitação. Mesmo que não o saiba, ou sabendo, tanto faz.

Romper com o passado é o caminho para quem procura paz de espírito.

Não um romper romper, de quem vira a cara sempre que se cruzam. Não um romper de quem deixa de falar ou de quem está muito, mas mesmo muito, zangado, não.

Antes um romper tranquilo, de quem ama e acarinha mas sabe que já passou. Um romper de quem agradece mas sabe que é hora de seguir, de avançar para a construção de novos passados.

Um romper de quem perdeu o medo, abriu os olhos, olhou o espelho, e seguiu em frente.

Esse romper.



segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Trabalho é trabalho


Por muito que se goste daquilo que se faz, e eu gosto, há sempre dias em que nos apetece fazer outra coisa qualquer ou mesmo nada.

Dizer que trabalhamos por amor à camisola, independentemente daquilo que se ganha, é falso, estúpido e serve para alimentar essa mentalidade servil de que o trabalho dá saúde, honra e prestígio. Às vezes dá. Às vezes não. E se não precisássemos de ganhar dinheiro, com certeza não faltariam atividades, às quais não chamaríamos trabalho, que nos dessem prazer e fossem muito mais proveitosas socialmente do que o trabalho que fazemos por não haver outra forma de pagar o supermercado.

Dentro deste contexto, haver quem se ache no direito de beneficiar do trabalho alheio sem para isso ter de pagar o justo custo, desvalorizando não só o trabalho em si como as necessidades primárias de cada um, i.e, a sua inerente condição humana, é não só vergonhoso mas ofensivo e criminoso.

A escravatura, abolida há séculos, renasce assim nos hábitos daqueles que, tendo muito ou menos que isso mas o suficiente, passam por cima de “toda a palha” para satisfazerem as suas necessidades secundárias e manterem, à custa seja lá do que for, o nível de vida ao qual se acham no direito.

A esses, desejo sinceramente que, sem qualquer possibilidade de controle, cada cêntimo que deixam de pagar a quem de direito lhes caia por um qualquer cano e desapareça no espaço. Desejo ainda que essa realidade seja tão imediata que não deixe qualquer tipo de dúvida relativamente à sua causa – não paga, perde -, assim, sem mais nem menos; sem dó nem piedade e na mesma proporção – são cêntimos, perde cêntimos; são milhões, perde milhões. Isto sim, é justiça.

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Dos abusos, dos abusados e dos abusadores


Quarenta anos passaram desde aquele momento em que o amigo se abeirou de mim para perguntar, Gostas de alguém?, e eu, sincera, olhei-o naturalmente e respondi, Não, de ninguém. Mas ele tanto insistiu que eu, olhando em redor, acabei por apontar para quem estava mais perto e era, segundo os critérios de então, um dos mais cobiçados. Dele, disse eu. E o amigo, com o desalento estampado no rosto, ainda insistiu, Mas tens a certeza?
Eu encolhi os ombros sem saber que, nesse dia, em frente a ele, o amigo baixaria os olhos e, desolado, abanaria lentamente a cabeça enquanto as palavras lhe sairiam a custo – Não é de ti!

Talvez nesse tempo ainda existisse entre nós um espírito de combate, uma vontade de vencer. Ou talvez ele fosse mesmo assim, um lutador. Ou, talvez ainda, a sua convicção fosse maior do que a minha certeza, porque a verdade é que não desistiu. Esperava-me nos intervalos das aulas; ao final da manhã; ao início da tarde. Acompanhava-me e fazia-me rir. Alto, mais alto do que o comum. Magro, muito magro por causa da asma e feio. Sim, feio. Desengonçava-se todo para me fazer rir. E conseguia.

Mas eu tinha razão. Não gostava de ninguém. A não ser dos meus – do meu pai; do meu irmão; do meu primo…Na minha alma não morava nenhum desejo de paixão. Era um encolher de ombros. Um tanto me faz.

Há acontecimentos que nos marcam para o resto da vida. Que nos fecham a alma. Nos trancam o coração. Acontecimentos que nos roubam, num repente, aquilo que era suposto sermos nós a dar, devagar, com tempo, a seu tempo.

São acontecimentos conhecidos por muitos e reconhecidos por poucos. Acontecimentos que se calam e que, por se calarem, quem por eles passa dificilmente encontra a compreensão e a paciência que as marcas desses acontecimentos exigem.

Acontecimentos que carregamos anos e anos, por vezes toda a vida. Que nos obrigam a navegar ao seu sabor. Que nos incapacitam, nos escondem, nos mudam.

Acontecimentos que são fruto de uma sociedade defeituosa. Repressiva e reprimida. Uma sociedade construída para muitos, por alguns – os que acreditam que são livres mas de liberdade não sabem quase nada.

A liberdade vive dentro de nós. A liberdade, aliada à coragem de ser, liberta-nos verdadeiramente e, por nos libertar, deixa-nos ver o que realmente importa. E o que realmente importa tem muito pouco a ver com o que os nossos apetites mesquinhos e pontuais reclamam.

A repressão, mascarada de ordem, que temos vindo a implementar desde há séculos, para benefício de alguns e prejuízo de muitos, amachuca indelevelmente quem somos – seres de luz e de amor, de corpo e de alma.

A repressão, venha lá ela de onde vier, gera violência. Transforma tudo o que é bom em tudo o que é mau.

Andamos há anos a tapar as nossas bocas para, de vez em quando, criarmos o caos, e não nos apercebemos que, afinal, se calhar, bastaria destapá-las – mesmo que isso não seja assim tão simples.

Afinal, nunca é.


quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Última Hora!


Gosto de me sentar na bancada da cozinha, de manhã, a tomar o pequeno almoço.
Ligo o pequeno televisor e a box que o acompanha e, à medida que vou mastigando a bola de mistura recheada do que me apetecer, vou mudando de canal na esperança, sempre na esperança, de sentir que estou a par de tudo o que se passa no mundo.
Tarefa cada vez mais difícil, não pelo que acontece por aí mas por ficar sempre com uma estranha sensação de distração, de alheamento. Como se quem me transmite as notícias não as quisesse na verdade transmitir ou não as conheça também e, tal como eu, ande à procura da realidade que foge, cada vez mais, dos olhares de todos nós, ou quase todos.
Ontem, por exemplo, enterneci-me com o vídeo de um chimpanzé fêmea que, tendo sido capturada num estado de saúde muito debilitado, se despede da sua salvadora com um abraço reconhecido e humano. Quem não se enterneceria?! No entanto, após uma busca – fácil e rápida -, no Google, percebo que o vídeo que o jornal da manhã me oferece tem mais de um mês. E, quando finalmente me passou a comoção do abraço, pensei para mim que talvez, talvez, os jornalistas não saibam, não tenham forma de saber, que neste mundo de profundas mudanças todos os dias acontecem coisas. Se calhar não tão importantes quanto a manifestação, afinal humana, de um símio que nos inspira ternura e amor – muito adequado, por necessário, para os tempos que correm -, mas atuais como se querem as notícias – atuais ao jeito de última hora. Tal e qual eram anunciadas, pelos ardinas, nos primórdios do jornalismo quando os jornalistas eram apenas meia dúzia de coscuvilheiros que gostavam de escrever.
 
 

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Bons para um lado. Maus para o outro.


Não sou saudosista. Pelo menos não em demasia. Com o tempo tenho-me vindo a adaptar melhor às mudanças, mesmo àquelas que se revelam menos boas. Aprendi que as únicas mudanças que importam verdadeiramente são aquelas que se realizam dentro de nós. As outras, são pontuais – uma vez adaptados, tudo regressa à normalidade, tudo entra no ram-ram do dia-a-dia. É a adaptação que dá trabalho, causa stresses e angústias, principalmente porque a tendência puxa sempre para a transformação do que é no que era, e raramente para o aproveitamento de uma oportunidade única de crescimento. Isto dito assim pode parecer um pouco confuso. Mas não deixa de ser verdadeiro.
A nossa resistência à mudança, seja ela particular ou comum, é histórica e visceral. Veja-se, por exemplo, a reação geral aquando da invenção do comboio – “o diabo de ferro” -, da indústria, ou mesmo dos computadores. Sempre que surge algo de novo as nossas pernas tremem, o coração sobressalta-se – todos sabemos que alguém vai cair para outros se levantarem um pouco mais. É assim a vida. Sempre foi. Dinâmica.
O que importa aqui é que as mudanças privilegiem a maioria e que todos, ou quase todos, possamos crescer com elas – tornarmo-nos mais humanos, nem que para isso seja necessário mudar de caminho numa espécie de retorno que nunca o é. Numa espécie de aproveitamento da filosofia de ontem – se ela for melhor do que a de hoje – e da tecnologia de hoje – se ela for melhor do que a de ontem.
O que importa aqui é que sejamos capazes de aprender verdadeiramente com a experiência e, para isso, não podemos esquecer o passado.
O que importa aqui é que sejamos capazes, através desse passado, de compreender o presente e de, sobre ele, termos uma palavra a dizer.
O que importa aqui é que não nos deixemos adormecer mas que não esqueçamos que o bem maior é sempre o bem comum e que nem sempre, por muito boa vontade que exista, a fronteira entre um e outro é clara. Basta termos a consciência de que a visão do mundo muda com o olhar de cada um de nós.
Por isso, talvez possamos, e devamos, começar pela simplicidade de dividir o mundo em dois, os sentimentos em dois, as vontades em duas – bons para um lado e maus para o outro. É, sem dúvida, um cliché, mas a rejeição dos clichés também é um preconceito.
As mudanças ensinaram-me – estão a ensinar-me -, a crescer. E esse crescimento passa, necessariamente, por eliminar, o mais possível, o que em mim faz mal e alimentar, o mais possível, o que em mim faz bem. É esse o caminho para a nossa humanidade.
 
 

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

O pato de borracha


 
Enquanto na Índia se tenta encobrir o homicídio de uma garota de dezasseis anos violada em Outubro por seis manfias que deveriam ser encarcerados para todo o sempre mas que, em vez disso, puderam fazer valer os seus direitos ao poder – violá-la uma outra vez e por fim queimá-la que é para aprender a estar calada que as mulheres, na Índia e, vai-se a ver, em muitos outros lugares, são para ser violadas, abusadas, desrespeitadas e postas na linha à força de músculos, tal e qual como nos primórdios da humanidade em que a sobrevivência deles dependia.
Dizia eu que, enquanto na Índia se passa isto que aqui ledes, em Taiwan é notícia o rebentamento de um pato gigante que, apesar de ser considerado obra de arte, não passa de uma versão exageradíssima dos pequenos patos amarelos que costumam servir de incentivo aos banhos dos mais pequenos.
Pois, em Taiwan, as pessoas ficaram quase tão tristes com o rebentamento do pato quanto na Índia com o homicídio da jovem.
Enquanto isto, no Camboja, vivem-se horas de confusão à pala da greve dos trabalhadores têxteis. Quem vir as imagens que de lá chegam perceberá que cada cêntimo que paga por cada peça de roupa não serve, com certeza, para melhorar o nível de vida daquela gente.
Pelo Ocidente não sei o que se passa. Provavelmente, mais ou menos as mesmas coisas mas, enquanto nos entretemos com notícias mais distantes, vamo-nos abstraindo das nossas…
Se calhar o mundo foi sempre assim – o que não abona muito a seu favor -, só que agora tudo se sabe. Até que existem patos gigantes, feitos de borracha, a nadar em grandes lagos para deleite dos transeuntes.