quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Não tenho nada contra os ricos. Já contra os pobres, não posso dizer o mesmo




Hoje comemora-se o dia mundial da Justiça Social, o que equivale a dizer que se comemora uma coisa que nunca existiu. Talvez seja esse facto que transforma em palhaçada estes Dias Mundiais das Coisas Que Ainda Não Aconteceram E Que Não Se Sabe Se Algum Dia Acontecerão.
Eu, pessoalmente, não tenho nada contra os ricos. Muito pelo contrário – acho que todos deveríamos ser um deles. Já contra os pobres não posso dizer o mesmo – não gosto deles nem um bocadinho e acho, sinceramente, que deveriam ser erradicados o mais rapidamente possível.
Mas, neste universo, passam-se coisas que não nos passam pela cabeça ou, mesmo que o façam, é em forma de anedota, pelo que nós, os mais pequenos e em número maior, andamos não só às aranhas mas também a apanhar bonés, como se costumava dizer há alguns anos atrás.
O raciocínio mais rápido, e fácil, é acreditar que os pobres continuam a existir porque isso faz dos ricos mais ricos, tratando-se assim de uma grande injustiça social (talvez o dia de hoje devesse ser precisamente o Dia Mundial da Injustiça Social). Contudo, há algo que me confunde – dado que o dinheiro não é uma dádiva da natureza mas um recurso inventado por nós para nos facilitar a vida, por que carga de água não se adaptam as suas leis ao crescimento da população e não se zela para que todos possamos ter uma vida boa – note-se que eu escrevi Boa e não Digna. É que Digna é outra coisa. Não basta ser rico para se ser digno.
Esse raciocínio deixa-me sempre uma certa estranheza – se fossemos todos ricos ninguém precisava de andar a olhar por cima do ombro para que nada lhe acontecesse; toda a gente podia gastar dinheiro em barda, pelo que a economia prosperaria, e muito! Dir-me-ão: Mas os ricos perderiam uma coisa que lhes é preciosa – o Poder. A questão é: será que o têm mesmo? Serão eles os seus detentores? Seremos nós, habitantes deste pequeno calhau – o terceiro a contar de um dos milhares de sóis existentes por esse universo fora -, detentores de qualquer tipo de Poder? Ou existirão “mais coisas entre o céu e a Terra do que sonha a nossa vã filosofia”?

2 comentários:

Majo disse...

~
~ Um texto inteligente, de refinada ironia, desenvolvido a partir de um aparente paradoxo. ~
~
~ Estou consigo e com W.Shakespeare:
~
""Ser ou não ser, eis a questão.""

""Há mais coisas entre o céu e a Terra, do que supõe a vossa vã filosofia.""

~ ~ ~ Abraço. ~ ~ ~

Jardineiro do Rei disse...

Humor refinado o teu, Antígona...
refinado e amargo. Às vezes dou comigo a pensar nesta coisa de uns serem pobres e outros serem ricos. Também eu tenho dúvidas se ser rico é sinónimo de ser poderoso, de ter influência, de condicionar as decisões. Acho que os ricos não têm tanto poder assim. Há uma classe de pobres que, por vezes, tem um poder decisório muito mais evidente e refinado. Eu vou inventar um termo (e se calhar ser enforcado a seguir...). Vou chamar a esses pobres com poder de decisão, de "pobres profissionais". São aqueles pobres que, melhor que ninguém, se movimentam nos corredores das autarquias, da Segurança Social, das Misericórdias. Que sabem como fintar os fiscais do Rendimento Social de Inserção. Que vivem no bairro social, mas têm um Mercedes topo de gama à porta. Descendo um pouco abaixo, vamos encontrar, gente que viveu uma vida inteira no bairro degradado, que têm ligações ilegais da água e da luz sem que a EDP ou a Fiscalização Municipal se atreva a por cobro à situação, que dizem: Só saio daqui se a Câmara me der uma casa! E acaba por dar mesmo... Isto é ter Poder! Caramba... eu paguei uma casa durante 25 anos, entro em pânico quando a factura da água ou da luz não chega no dia certo (Não vá ter-se extraviado...). Estes são os "pobres profissionais". Os verdadeiros pobres são bem outros. São aqueles que passam um vida inteira na fila de atendimento e morrem sem conseguir chegar ao guichet... São os mal-amados da fortuna. Os filhos de um Deus-menor. E desses ninguém fala. Falei eu, pronto! (e acho que já falei demais).

Um abraço minha Amiga!

João