domingo, 16 de fevereiro de 2014

Boçalidades


Já uma vez escrevi aqui sobre aquilo que nos move. Hoje apetece-me escrever outra vez.
Ultimamente tenho andado a fazer um certo esforço para compreender o porquê de defender isto e não aquilo; de pensar isto e não aquilo; de sentir isto e não aquilo. Tenho chegado à conclusão que, se não sempre, pelo menos na maioria das vezes, as minhas filosofias se prendem, tão só, àquilo que eu sou, aos meus interesses. Considerando que sempre que algo me faz mal – me faz, fisicamente mal -, vai contra os meus interesses.
Daí que me tem parecido cada vez mais despropositada esta mania que as pessoas têm de quererem vender o seu peixe ao alheio quando o que o alheio é se distingue de si. E tão mais disparatada é, quanto maior a distinção.
O que nos falta, em grande quantidade, é conhecimento. A uns o conhecimento do mundo, a todos o conhecimento de si.
Perguntarmo-nos o porquê do que nos acontece e da forma como reagimos aos outros e ao ambiente, seria uma atitude deveras inteligente e poderia até constituir um belo de um trampolim para um mundo melhor, mais humano, mais civilizado. Isso, ao invés de optarmos pelo mais simples – a certeza de que tudo o que é mau vem de fora e de que aquilo que nos motiva é um bem maior para o mundo em geral, sem pararmos um bocadinho para pensar que, se calhar, será um bem maior para cada um de nós em particular. Isto, já para não falar nas invejas, nos ódios de estimação ou nos traumas que, de tão afundados, já esquecemos mas nos servem de motor.
Eu, por exemplo, gostaria muito que alguém se mexesse (porque eu não estou para isso) para reabilitar este lugar para onde vim viver e que faz a vergonha de qualquer cidadão mais civilizado. A degradação causada pela profunda ignorância de tudo o que é civilidade, de grande parte daqueles que por cá vivem, transforma um lugar que poderia ter os seus pitorescos encantos, num lugar degradado, sujo, velho e feio. Constituído por algumas quintas consideradas, quer por quem nelas não vive quer por quem as habita, mundos à parte, o resto é lixo, salvo honrosas exceções de menos de uma meia dúzia de pessoas que, como nós, precisam de uma certa harmonia à sua volta.
Ora, porque é que eu gostaria de reabilitar este lugar? Porque sou uma pessoa muito boa e acredito que, uma vez reabilitado, faria mais felizes todas as pessoas que por cá vivem, mesmo aquelas que nem sabem o que isso é?
Claro que não! Eu gostaria de o reabilitar porque é o lugar onde EU vivo. Porque detesto ter de passar por uma rua degradada para chegar à minha e porque não aguento mais à boçalidade de certos vizinhos.
Em suma, o interesse tem, na verdade, uma raiz particular e egoísta como, aliás, todos os interesses. Não quer isto dizer que não sejam interesses válidos, obviamente. Mas é importante que sempre que os manifestemos tenhamos a coragem de assumir a sua proveniência em vez de tentarmos, a toda a hora, atirar areia aos olhos dos outros, e aos nossos – principalmente aos nossos!
 
 

4 comentários:

A Casa Madeira disse...

Bom dia! como Darcy Ribeiro disse um dia: Só a duas opções nesta vida: Se resignar ou se indignar. E eu não vou me resignar numca. Dessa maneira acho que acabamos ou pelo menos tentamos fazer um mundo melhor, não só para nós mas a tudo a nossa volta.
Aproveito tbm para um convite a conhecer: cerebroquepulsa.blogspot.com.br
Paz e Bem

CF disse...

A questão é a visão social, cada vez mais em desuso. Quanto maiores os umbigos de cada um, mais degradação encontraremos. E o pior é que o sentido não se inverte...

Beijinhos...

Jardineiro do Rei disse...

Li e reli o que escreveste. Fixei a minha atenção num ponto em que falas de civismo, de cidadania, ou da falta dela. Deixa-me contar-te uma pequena história. Moro nesta rua e nesta casa há um quarto de século. 25 anos, dia por dia. Quando cá cheguei, era um local aprazível, com com espaço, árvores, ar puro. O espaço continua a ser o mesmo, as árvores, menos mas ainda há. O ar deixou de ser puro e o espaço já não é aprazível. Lixo, casas degradadas, paredes "grafitadas". Durante alguns anos, nós, um grupo de moradores, achamos, por uma questão de cidadania, de defesa do espaço, conscientes de que a casa onde moramos não se esgota entre as suas paredes, mas completa-se no espaço exterior, que devíamos cuidar daquele espaço. E durante um tempo foi possível plantar, regar, limpar. Mas a pressão dos nada fazem e só degradam fez-nos parar e desistir. Nunca imaginei sermos ter tão mal tratados pelos meus vizinhos. Ao pontos de plantarmos uma árvore num dia e no outro ela estar arrancada e destruída. Quando eu hoje vejo as ruas esburacadas o lixo espalhado, digo: As pessoas têm, exatamente, aquilo que merecem. Não têm o direito de se queixar.

Um abraço

João

Majo disse...

~ Porque será que não acredito naquilo que chama ser o seu puro egoísmo?

Se Câmara do seu município a convidasse para participar numa formação sobre cidadania e se a planificação a entusiasmasse; tenho a certeza que colaboraria.

As pessoas andam tensas por motivos de fragilidade económica e quando não têm conforto em casa, o conforto da rua é uma ofensa.

Não é preciso ter grandes conhecimentos de psicologia para identificar nos grafitis, problemas de exclusão e revolta.

Penso que as pessoas bem formadas nunca devem desistir, custe o que custar, devem ser intervenientes e denunciarem as situações.

Os jovens irreverentes, precisam de apoio, lugares de convívio e desporto, de serem orientados para atividades saudáveis e socializadoras, capazes de dar vazão a excessos de energia, tal como o escutismo.

Nós, defensores da Natureza, da Ecologia, do Equilíbrio e da Harmonia, não podemos esmorecer, nunca! ~