A vida é estranha para quem vive intensamente, para quem nela põe o corpo e a alma sem se aperceber
que ela pode consumir ambos.
Não há muito resolvi reavivar memórias. Não com o objetivo
singelo de as reviver mas com aquele, mais ambicioso, de com elas me poder
mudar, poder deixar de ser exatamente aquilo que tenho sido e avançar um pouco
mais no sentido de ser aquilo que gostaria de vir a ser.
Não é um exercício fácil. Não é. Coisas que acreditávamos
mortas e enterradas revivem em nós e, à medida que se avança, aproximam-se cada
vez mais. A tal ponto que até parece ter sido ontem. Até sermos capazes
de algo impensável – voltar a sentir o que se sentiu naquele exato momento.
E é precisamente aí que constatamos que afinal não
enterrámos coisíssima nenhuma. Limitámo-nos a cobri-la com outra e mais outra e
outra ainda, até sermos capazes de fingir que desapareceu, a miserável.
Mas um dia, sem darmos por isso, salta-nos um tique, um
gesto estranho, uma e outra e outra noite mal dormida, repleta de sonhos
perturbadores, insónias; ou simplesmente falta-nos o ar, mesmo que ele abunde à
nossa volta; ou deixamo-nos entristecer; ou fugimos de quem amamos acreditando
detestar. Um dia, algo se revela. E é esse o dia que importa; esse é o dia que não
podemos deixar escapar. Porque, se o fizermos, nunca mais seremos os mesmos,
não por termos dominado a vida mas por termos deixado que ela nos dominasse a
nós.
1 comentário:
Ui ca medo :)
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