Tenho andado ocupada a salvar cães.
Foi uma semana carregada de emoção. Mas não
é verdade que tenha andado ocupada a salvar cães. Na verdade foi um cão. Um
único cão. O cão pelo qual me apaixonei.
A primeira vez que o vi, andava a passear a Puca que está
cada vez mais confiante e afoita, que se acha invencível e que se
atira a tudo quanto é canídeo na certeza de que será ela a dominar, e quanto
mais depressa eles souberem isso, melhor.
O outro, altivo, estava pespegado a meio do caminho, a
olhar-nos.
A minha primeira reação foi pegar na Puca ao colo. As pernas
fraquejaram-me e pensei – já foste! A parva da cadela levou a mal o colo, lutou
e saltou para o chão direta ao bicho que nem se moveu. Grande, de cabeça
triangular, com uma mancha negra a tapar-lhe um dos olhos em contraste com o
branco do pelo, nem se mexeu. Deixou a cadela refilar, cheirou-a, acalmou-a com
o não sei quê que ele tem e que acalma quem tem a ousadia de se aproximar, e
seguiu caminho, atrás de nós, como que a dizer, vocês são os tais.
Desde então não mais nos deixou a porta. Durante o dia
andava por aí, no meio das ervas, a saltar muros, mas à noite aninhava-se ao
portão, ou debaixo dos carros, e esperava. Esperava por água, por alimento, por
uma manifestação de carinho.
Ao fim de algumas semanas não parecia o mesmo. As carraças
tinham tomado conta dele. Chupavam-lhe tanto sangue que o animal deixou de ter
forças para saltar e ia-se deixando ficar, estendido, na sombra dos
automóveis.
O meu irmão, que lhe viu a foto e que há muito queria um
cão, acreditou ter encontrado o animal perfeito.
A semana passou-se entre desinfestações, banhos,
veterinária, busca de empresas de transportes de animais…mas passou-se,
sobretudo, nesta azáfama interior que começa pelo combate ao medo e acaba num
amor quase incondicional. Passou-se sobretudo num crescente apego e no
imediato, e necessário, desapego para que o possa enviar para a Holanda sem
ficar de coração partido. Passou-se, e continua a passar-se, na certeza de que
quem ama escolhe o melhor para o objeto amado e não a satisfação dos seus
próprios interesses.
E tudo isto é bonito, mas o coração, que é quem sente, não
deixa de doer.
No final de Junho, o Moo – tal é o nome que lhe foi
destinado -, viajará de avião para Amesterdão. Entretanto, passará um mês e
meio numa espécie de vigília, junto da veterinária que tratará de tudo o que é
preciso tratar para que um animal de companhia possa viajar além-fronteiras.
Todos os dias, eu penso no Moo. Como estará? Sei que já foi
operado e tudo correu bem. Estará feliz? Sentirá a minha falta?
3 comentários:
:'(
Vamos mandar o Ramone, a sério, e fico eu com o Moo :D
O Moo teve uma sorte danada... :)
Pode não acreditar, mas quando estive na Holanda e vim cá buscar a Luna estive para lhe chamar Mooi (já não sei bem se se escreve assim), que significa linda lá naquela coisa que eles chamam língua...
Sente a sua falta de certeza e, quando a voltar a ver, vai mostrar-lho, com a gratidão que só os bichos conseguem demonstrar!
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