quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Vivemos no Big Brother e nem sequer damos por isso


Quando encarrilamos no ram ram da vida, qualquer mudança parece improvável, extremamente difícil, ou mesmo catastrófica. A vida é assim mesmo, dizemos nós, e se deixa de ser parecemos estorninhos a bater asas sem rumo nenhum.

Há contudo momentos históricos, em que as mudanças são tão profundas que se sentem, que se respiram, no dia-a-dia, nas coisas mais pequenas, mais comezinhas, alterando a nossa vida, já não de uma forma subtil, mas de uma forma descarada, quase obscena, que nos dá vontade de fugir para um retiro espiritual em que as portagens das autoestradas, por exemplo, não sejam cobradas à traição, como se o objetivo fosse muito mais vasto do que uma simples portagem – como se o objetivo fosse foder o cidadão que, na total ausência de informação, por elas passa e fica registado sem saber, no entanto, de que forma poderá proceder ao pagamento, ou quando, evitando assim as coimas que de instrumento secundário passaram a principal.

Há momentos históricos em que se cumprem as premonições de certos visionários como, por exemplo, George Orwell de quem já estivemos muito mais longe – se é que não estamos já lá; ou de Saramago, quem sabe?... meu Deus espero que não, não quero – quem quererá?!  - viver num mundo de cegos, ou dentro de cavernas. E, dizendo isto, compreendo o quão fácil é viver já lá e não perceber. Não fossem as árvores e o mar, e a realidade confundir-se-ia com a ficção.

Há, portanto, momentos históricos em que se torna cada vez mais difícil mantermo-nos à margem, seguirmos com as nossas vidinhas, que por muito desinteressantes que sejam são as nossas, sem nos sentirmos violados assim que metemos os pés fora da porta. E são esses momentos históricos que, ao nos imporem mudanças, nos exigem mudança. São momentos históricos como este que estamos a viver que, de tão apertados, nos dão apenas duas alternativas – ou nos juntamos a eles ou estamos contra eles. Mas como eles são tão poucos, estão tão longe e ocupam espaços tão delimitados, é pouco provável que aceitem no seu seio todos nós que somos tantos. Assim, resta-nos o outro lado, aquele em que somos obrigados a mudar e recuamos no tempo, e reaprendemos a viver como viviam, por exemplo, os nossos avós – sem telemóveis, sem carros, sem autoestradas. Porque sem médicos, sem saúde, sem medicamentos e sem educação, estão eles a tratar disso. Confiantes, ainda assim, que continuaremos a alimentá-los com as outras coisas, as supérfluas e mantendo-nos no engano que precisamos delas e que até não custam muito.

Sem comentários: