sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Depressão


Finalmente teve coragem para abrir o talho e espalhar cartazes, enormes e escritos à mão, pelas redondezas. “Já abriu o talho no Texugo. Com Tudo” – era o que se lia ao contornar as rotundas e à medida que nos íamos aproximando do local.
Lá dentro uma panóplia de arrumações, prateleiras, muitas, balcões, dois e frigoríficos; um fogareiro gigante, daqueles modernos que o carvão é cancerígeno…um espaço de meter inveja a qualquer comerciante. Tudo vazio. Apenas um dos balcões exibia algumas peças de carne.
Entrei para uma perna de peru. Nada.
É claro que os próprios cartazes, escritos à mão e cortados a dentes, só por si já faziam transparecer o esforço hercúleo que o pobre homem teve de invocar para abrir as portas fechadas havia tanto tempo. E depois ele mesmo. De cigarro na mão e olhar no chão. Os ombros a descaírem como quem não acha horizonte nem ao seu nível! Não era para abrir, disse ele. Isto está tudo tão mau. Até o outro, na outra terra, já tinha fechado. Mas não tinha mais onde se agarrar e, ainda por cima, doente, dizia ele. Talvez dos cigarros. Talvez da postura. Depressão é doença. A pior. Tira as forças a qualquer um. Por grandes que sejam vão-se com a vontade.
Não durou uma semana. Voltou a fechar. Na montra, escrito à mão, está outro cartaz – “Vendo esta loja” e, por baixo, um número de telefone que já ninguém descortina porque o tempo levou a tinta.
Nem sabe, o pobre, que mesmo que haja alguém capaz de comprar tal espaço, não saberá como o contactar…

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