quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Despeito...

...do latim despectu-, significa "olhar do alto, de cima"; no dativo, quer dizer "desprezo".
Muito semelhante ao ódio, ao rancor e, até ao amor, não tem origem no outro, mas em nós mesmo. É claro que não aparece por geração espontânea, mas nem o ódio, nem o rancor e nem o amor, aparece por características internas e não externas, e vira ao contrário qualquer um.
Tem, em relação aos outros sentimentos, a desvantagem de ser gerador. Odeio porque fui despeitada; detesto pela mesma razão e sou bem capaz de amar, ou pensar que amo, porque me deram atenção…
São raras as pessoas que não se deixam dominar pelos sentimentos, nem que seja temporariamente. Portanto, são raras aquelas capazes de vislumbrar o papel que desempenharam em cada acto da sua própria vida.
Fui abandonada, enganada, despeitada e, por isso, sou vítima e o outro, ou os outros, são os culpados, aqueles sobre os quais eu hei-de, mais cedo ou mais tarde, despejar a minha raiva e o meu ódio!
Há até quem alimente aquela velha máxima da «vingança que se serve fria», sem perceber que, à espera que arrefeça, terá de não deixar morrer os sentimentos que a justificam e se vai envenenando por dentro, porque é isso que certos sentimentos fazem - envenenam. E, muitas vezes, o outro só seguiu o seu caminho. Muitas vezes o outro só tentou ser feliz, porque, convenhamos, não é muito comum abrirmos, assim, mão da felicidade. Todos nós a procuramos, alguns a vida inteira… A mudança de rumo é, na grande maioria dos casos, apenas a concretização de algo que já existia, nada mais do que isso.
Odiar em certos momentos é compreensível e até saudável. Alimentar esse ódio ad aeternum, é doentio. Estendê-lo a quem nada tem a ver com o assunto, é irracional. Mas os sentimentos são mesmo assim – irracionais. E ainda bem que o são.

3 comentários:

Sputnick disse...

diz-se que"olho por olho, e o mundo acabará cego", mas, por vezes nem os dois olhos.

CF disse...

Tão giro o texto Antígona. Toma sorrisos :):)

MB disse...

Brilhante texto, carregadino de tantas verdades que devia ser lido por mto boa gente. Felizmente, só uma vez fui atingida por este sentimento doentio de alguém, e acabou com 3 pneus furados do meu carro e o desaparecimento da respectiva antena... enfim contrariedades que só me deram mais força e, de certeza, enfraqueceram quem praticou o acto. O chato disto é q tenho uma suspeita de quem possa ter sido e, como qualquer suspeita sem provas, corro o risco de ser injusta com alguém. Enfim a vida continua, bem felizmente e até tinha esquecido o sucedido, mas este texto está realmente muito bom e vivam os sentimentos irracionais (os bons, claro).
Desejo que em 2011 continue a abrilhantar este blog com a qualidade de textos a q nos foi habituando. Muitas felicidades