quarta-feira, 26 de junho de 2013

1979

Lembro-me perfeitamente. Amesterdão debatia-se sob o gelo de um Inverno pesado que tardava em acabar.
À sua volta, a maior parte dos lagos, pelo menos os maiores, serviam de pista para os inúmeros adeptos de aeromodelismo e eu, novata naquelas andanças, embrulhava-me num casaco forrado a pelo de carneiro e desaparecia numas botas feitas com a pele de um animal da mesma espécie.
Todas as casas tinham aquecimento, até mesmo o minúsculo apartamento que alugámos à última hora num Aparthotel de uma daquelas ilhas minúsculas separadas da cidade por canais minúsculos atravessados por uma espécie de jangadas suficientemente fortes para levar dois ou três carros e uma dúzia de pessoas. Era um percurso engraçado – ficávamos sempre com a sensação que um dos lados da jangada já estava a atracar quando o outro ainda não tinha começado a navegar.
Estávamos num outro mundo. Não, num outro universo. Estávamos em 1979 e Portugal ainda respirava o mesmo ar que o alimentou ao longo de 48 longos anos. Tínhamos saído da província, fechada, pequenina, mesquinha, e tínhamos mergulhado na vida.
Quando o Inverno finalmente levantou âncora fomo-nos encaixando em bares e restaurantes, todos na mesma ilha. Trabalhávamos cerca de doze horas diárias e tínhamos um descanso semanal. Recebíamos à semana, e o dinheiro era tanto que dava para estoirar no dia de folga e juntar as sobras para trazer para Portugal.
Uma vez por semana íamos a Amesterdão e, por vezes, aventurávamo-nos numa ou noutra noite mais afoita e acompanhada. Afinal de contas ficava a quinze minutos de caminho, nem tanto, e era uma cidade absolutamente fascinante.
Estávamos em 1979 e éramos felizes. Nada nos cansava. Trabalho e diversão confundiam-se e o dinheiro que trouxemos alimentou-nos durante meses.
Nunca mais vivi assim.
 

1 comentário:

CF disse...

:))) Mas viveste, e parece que foi bom...